O PROBLEMA DO CONHECIMENTO: RAZÃO OU EXPERIÊNCIA


A história do pensamento ocidental testemunha a atenção que as especulações filosóficas concentram em determinados temas. Esses temas, discutidos  em diversos períodos, tornaram-se o que chamamos de problemas filosóficos. Um dos principais temas discutidos pelas filosofia foi o problema do conhecimento, ou seja, para compreender a realidade e a si próprio, buscou-se entender a própria capacidade de compreensão e formação do conhecimento.

Como adquirimos conhecimento? É primariamente pelo uso da razão? Ou a experiência obtida por intermédio de nossos sentidos desempenha o papel mais significativo no modo como formamos o conhecimento sobre as coisas? 

Muito da história da filosofia ocidental tem sido influenciada por essa oposição básica entre razão e experiência como princípios fundamentais do conhecimento. Especificamente, este é o principal pomo da discórdia entre duas linhas filosóficas: racionalismo e empirismo.

Para entender o que está em questão entre teorias do conhecimento e do empirismo, é conveniente considerarmos três distinções básicas usadas pelos filósofos para elucidar as diferenças entre eles.

A priori x a posteriori

Algo é conhecível a priori se pode ser conhecido sem referência à experiência, ou seja, sem qualquer investigação empírica de como as coisas são e estão realmente no mundo; "2 + 2 = 4 é conhecido a priori - você não precisa sair andando pelo mundo para constatar essa verdade. Por contraste, determinadas coisas para serem constatadas é necessário uma investigação como sair andando pelo mundo para constatar se é verdade. Por exemplo, "o carvão é preto"- sendo uma verdade em que você precisa ver um pedaço de carvão - conhecimento a posteriori. Para ter certeza disso é preciso da experiência para constatar se é verdade.

Analítico x Sintético

Uma proposição é analítica caso não ofereça mais informações que a já contida nos significados dos termos envolvidos. A verdade da afirmação "toda as solteiras não são casadas" é aparente pela simples virtude de compreensão do significado e da relação das palavras usadas. Em contrapartida, a afirmação "todas as solteiras são infelizes" é sintética - ela junta (sintetiza) conceitos diferentes para transmitir uma informação significativa (uma informação errônea, neste caso). Para saber se a afirmação é verdadeira ou não, você precisaria checar se todas as mulheres não casadas são felizes ou infelizes.

Verdade Contingente x Verdade Necessária

Uma verdade necessária é aquela que não pode ser de outra forma - deve ser verdadeira em quaisquer circunstância, tempo ou lugar. Por exemplo, 2 + 2 é sempre 4 seja no passado, hoje ou no futuro, na China, no Brasil ou na França. Uma verdade contingente é verdadeira, mas talvez não tivesse sido se as coisas no mundo tivessem sido diferentes. Por exemplo, "a maioria dos meninos preferem futebol a outros esportes" é contingente - pode ou não ser verdadeira, dependendo de como a maioria dos meninos pensam sobre futebol. 

Parece haver um alinhamento óbvio entre essas distinções: então, à primeira vista, uma afirmação analítica, se verdadeira, o é necessariamente e é conhecida a priori; e uma proposição sintética, se verdadeira, o é eventualmente e é conhecida a posteriori. Na realidade, porém, as coisas não são nem de longe tão simples, e a principal diferença entre os empiristas e os racionalistas pode ser apreendida pela diferença no modo como escolhem abordar esses termos. Assim, a incumbência dos racionalistas é mostrar que fatos significantes ou significativos sobre o mundo podem ser descobertos por meios racionais, não empíricos. De modo inverso, a meta do empirista com frequência  é mostrar que fatos aparentemente a priori, como os da matemática, são verdades analíticas.

Neste sentido, racionalistas e empiristas podem discordar em vários aspectos mas ambos concordam que podemos formar conhecimento sobre as coisas e existe alguma base (origem) sobre a qual se fundamenta o conhecimento: razão ou experiência.

Os racionalistas diriam que a fonte de nossos conhecimentos são os princípios lógicos inatos a nós (que nasce conosco como uma programação), ou seja, somente a razão trabalhando com princípios lógicos, como a matemática ou conceitos filosóficos, pode alcançar conhecimento verdadeiro. Os sentidos para os racionalistas seriam fontes de erros e confusões sobre a complexa realidade do mundo.

Já os empiristas acreditavam que a fonte de nossos conhecimentos são os dados sensoriais, nossa percepção. As experiências que possuímos é que nos possibilitam formar ideias das coisas, pois nada vem a mente sem antes passar pelos sentidos. Afirmavam que ao nascermos nossa mente é como uma folha em branco, completamente desprovida de ideias, sendo preenchidas pelas nossas experiências.

Buscando uma solução para o impasse criado pelo racionalismo e empirismo, Kant afirma que todo conhecimento começa com a experiência, mas que a experiência sozinha não nos dá o conhecimento. Ou seja, é preciso um trabalho do sujeito para organizar os dados da experiência. Por isso, ele buscou saber como é o sujeito a priori, isto é, antes de qualquer experiência , e concluiu que existem no homem certas faculdades ou estruturas (que kant denomina formas da sensibilidade e do entendimento) que possibilitam  a experiência e determinam o conhecimento. 

Para kant, portanto, a experiência forneceria a matéria do conhecimento (os seres do mundo), enquanto a razão organizaria essa matéria de acordo com suas formas próprias, estruturas existentes a priori no pensamento que se chamou de apriorismo.

Por exemplo, nas pinturas da Catedral de Rouen (1892/1894), na França, em momentos diferentes do dia: o pintor Monet retrata não a catedral (a coisa-em-si no dizer de kant), mas a catedral tal como ela se apresenta ao longo das variações de luz de um dia ensolarado, nublado e em pleno Sol (o fenômeno no dizer de Kant):

(Síntese dos livros de Ben Dupré - 50 ideias de filosofia que você precisa conhecer / Fundamentos da filosofia de Gilberto Cotrim)

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