Habermas e a Teoria Crítica
Habermas é sem
dúvida o maior representante da chamada segunda geração da Escola de Frankfurt.
Notoriedade ganha em parte por dar seguimento aos fundamentos da tradição de uma forma criativa e diferente dos seus
antecessores, desviando-se de posições aporéticas contidas na tradição e outra
parte por influenciar toda uma nova geração de pensadores como Axel Honneth,
Seyla Benhabib entre outros que se dispusseram a dar continuidade ao seu
projeto crítico emancipador.
Na tentativa de não comprometer todo o projeto
crítico, Habermas cria um novo paradigma
explicativo que não apenas restauraria o projeto crítico, mas também serviria
como base de análise para o entendimento das relações e comportamento das
pessoas em sociedade, isto é, Habermas se compromete com o desenvolvimento de
uma teoria crítica imanente orientada por potenciais de emancipação contidos na
própria realidade observada, ou seja, a Teoria Crítica de Habermas não se
limitaria apenas a apontar as patologias da sociedade capitalista, mas buscaria
entender principalmente as possibilidades de emancipação dentro de um contexto
de conflito através de uma avaliação reflexiva. Entretanto, Habermas acreditava
ser necessário repensar algumas terminologias marxistas da tradição que não
estariam de acordo com as necessidades da realidade atual, ou seja, já não
seriam suficientemente críticas frente a realidade atual, porque ignorariam
aspectos decisivos das relações sociais[1], entre elas, o
próprio sentido de Emancipação que deveria ser revisto. Neste sentido Habermas
busca uma nova condução da Teoria Crítica em direção ao pensamento democrático,
trazendo a tona temas como Esfera Pública e Ação Comunicativa.
Diferentemente
de Adorno e Horkheimer que acreditavam que as esferas públicas somente eram
mobilizadas e dominadas por uma única forma de racionalidade (a
Instrumental)Habermas propõe uma segunda racionalidade (a Comunicativa),
configurando todas as formas de conflitos no sentido de organização social
dentro de um contexto político-democrático. Para Habermas ambas as formas de
racionalidade caracterizariam o ethos social, inerentes a ação humana, porém, a
ação Instrumental seria aquela voltada para o mundo dos fins determinados, para
a técnica, o trabalho propriamente dito em que o agente busca os meios
necessários para dominação da natureza e produção das condições materiais que
permitem a cordenação de ações. Já a ação Comunicativa é aquela que surge para
orientações de entendimento, permitindo a reprodução simbólica da sociedade
(contraste entre estas duas formas de ação estaria no fato da segunda não estar
direcionada para a manipulação de objetos e pessoas em vista a reprodução
material[2]). Portanto, a
esfera pública, segundo Habermas, desempenharia um papel fundamental para o
êxito deste processo de reprodução simbólica, sendo um espaço de constantes
troca comunicativa racional e falhas neste espaço de troca traria alguns
problemas nos processos de socialização fundamentais para o desenvolvimento dos
indivíduos autonomos, eliminando o universo simbólico de cada cultura. Para
Habermas as falhas de comunicação são derivadas de bloqueios artificiais
criados por um fechamento cultural, devido a burocratização e criação de
padrões monetários de reprodução cultural. Entretanto, com a intenção de
compreender estas questões Habermas cria as as terminologias de “sistema” e
“mundo da vida” como bases para o entendimento do conceito de sociedade e suas
interações. Sistema seria a lógica instrumental provida da economia e do poder
administrativo que na sociedade são apresentados em termos de monetarização e
burocratização. Segundo Habermas uma lógica sistêmica passa a invadir o mundo
da vida, ou seja, neste sentido mundo da vida é as relações interpessoais que
passam a ser coordenadas por meios padronizantes ao invés do entendimento
recíproco das partes envolvidas, que linguisticamente seriam empobrecidas pelo
capital e formas de controle burocrático, gerando assim, patologias como perca
de sentido e significação na cultura, bloqueios das capacidades socializantes,
além da coisificação das pessoas.
Com isto, Habermas deixa bastante claro que a
ação para o entendimento encontra-se basicamente no próprio processo de
reprodução cultural, que permite a continuidade de interpretação do mundo, nas
próprias instituições em que o indivíduo é socializado, nos processos de
aprendizado e constituição da personalidade: “o que está em jogo nos discursos
práticos não é a verdade de proposições, a adequação de avaliações, a boa
formação de construções ou a sinceridade de proferimentos expressivos, mas
apenas a correção de ações e de normas de ações: a questão é: será moralmente
correto?”[3]
Para Habermas a
sua teoria da comunicação é uma proposta a teoria crítica da sociedade, de modo
que a ação comunicativa seja analisada segundo suas relações, pois Habermas não
tenta idealizar um modelo de sociedade perfeita ou algo deste tipo, mas sim,
colocar em evidência aquilo que esta escrito na própria realidade de sujeitos
históricos, culturais, socialmente enraizados e propensos ao erro e ao egoísmo,
orientados por princípios democráticos que podem expressar acordos entre si por
meio de um consenso entre as partes. Para Habermas os conflitos sociais e a
linguagem são elementos centrais na estrutura social, portanto, seu projeto
crítico emancipador busca apresentar e evidenciar esses elementos dentro de um
contexto de entrave, através da análise da realidade na tentativa de expor os
potenciais reflexivos imersos nas interações linguísticas, com o objetivo de
compreensão das transformações sociais.
Portanto, o
projeto emancipador é delineado em termos de aproveitamento dos potenciais
comunicativos liberados pela quebra ou enfraquecimento de modelos autoritários,
além da pluralização de formas culturais que geram manifestações
estético-expressivas de crítica e reflexão que para serem comprovadas e aceitas
devem ser envolvidas por todos. Segundo Habermas o problema se encontra em
distorções comunicativas que podem ser contestadas e criticadas, portanto,
Habermas parece investir seu projeto numa análise investigativa das condições
comunicativas necessárias para que os envolvidos possam tomar decisões de seus
interesses livres de quaisquer impedimentos, por meio de processos de
entendimento mútuo.
Neste sentido a
Teoria Crítica Emancipatória de Habermas não busca orientar seus esforços
a modelos de sociedades virtuosas e
justas, incluindo elementos idealizantes, mas sim, preservar formas de ação
comunicativa que estariam ocupados a defender o avanço da lógica sistêmica ao mundo
da vida, preservando as interações comunicativas regulares.
Alex Machado da Silveira
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